Na
parada, aguardam o ônibus derradeiro. Todos conectados pelo pesar dos olhos
sonolentos, pelo ritmo das olhadas no relógio, pelo medo do hesitar dos ônibus.
Não se vêem nem se falam, todos os olhos nas chegadas, toda a impaciência para
os ônibus que não são seus ônibus. Desconectados de vida, mas alinhados, cada
um cumprindo seu propósito de esperas, mantendo o equilíbrio da parada.
Chega
o louco.
Percebem-no
pelos gritos que destoam na manhã sem voz. Imediato desconforto domina o
ambiente e acusa o louco de ofender com seus gritos a fala una do trânsito. Mas
o louco não nota que sua fala desvaira a sonoplastia urbana. Ninguém vai
avisá-lo de sua inadequação. Ele não se dá conta do desequilíbrio. Ninguém vai chamá-lo
a dizer que sua voz não é apropriada.
Os
rostos da parada se movem dissonantes, perdem o foco. Perderam a tênue unidade
do objetivo. Uns olham para o louco com pena, outros com desaprovação,
alguns veem, riem e cochicham. Uns tiram os fones de ouvido para ouvir o que o
louco diz, uns colocam os fones para não ouvir o que diz um louco. Uns não
olham – mantêm-se inexpressivos fingindo que não vêem, fingindo que não ouvem.
Ninguém percebe o mesmo louco: todos se desvelam um pouco. Alguém perdeu o
ônibus por alheamento. É o caos.
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