https://drive.google.com/file/d/1S7RvGFIhzkQjrw3OjzUI-lK6ig8DFhXb/view?usp=sharing
https://drive.google.com/file/d/1jvZ1E9SkJl5J-6Z4Tjzg-XzQaaorX4O5/view
não aprendi a dobrar o corpo com cuidado
amasso-o
até caber no próprio embrulho
como um nó
as pernas perdem espaço
surge um tombo sem barulho
acolchoado no tecido
os cabelos se enroscam
nos sapatos
não sei desatar
meus medos da ponta
dos dedos enroscados
ao chão
o assoalho é o portal
do fim do dia
o corpo fundido
teias tecidos peles
frizz e tédios
maçaroca indiscernível
não chora por dentro hoje feito
máscara de vidro toda a água
que não brota e que teria
em outras existências
inundado a casa e salgado a comida
e afogado nossos corpos hoje se esconde
em duras urnas te peço não derrama
adentro sem olhar meu rosto só
o teto que não é o teto em teus olhos
mortos como um abajur
um travesseiro um saco plástico
não derrama a água que não molha
e me inunda enquanto viro lençóis, enrolando um todo
de corpos que é o teu e o meu e os nossos mortos
que hoje não grito hoje não digo guias
de como tudo deveria ser e como é ruim
ser tudo que se é hoje eu me esqueço
e sou só corpo sem baixar de olhos nada
sem silêncios: puros
sejamos nós acordados e secos
sorrisos de nó
na garganta
porte de margarida
feridas nas patas – das pedras
e o olhar de quem pede perdão
às patas
mas não sabe o que é perdão
o que sabe:
o guizo e a grama
ossos, amor, sangue
o próprio corpo
a soma precisa de vida
a que levante e ande
feito um monge
o que mais sabe:
coçar-se muito cachorro
meditar nos olhos
nuvem, vento, eu
enquanto medito
seus olhos sem deus
ainda que dos gritos na câmara
caleidoscópios de ecos
retumbassem pelos cantos
mesmo que tocassem piano
dentro de teus órgãos
que plangessem tuas cordas
não há retorno
só o outro. só um louco no vazio
não há voz que te espalhe
somente câmaras em eco
somente a câmara onde deus
não põe o olho
grita em vão no espaço oco
grita o oco, puro e plano
a amada me embala a cama
onde o corpo se enovela em fuga
da frieza das paredes
estou bem no meio e tenho medo
de escapar desta manta
oscilo os ombros na movência
de minha pele em suas mãos
sem pele
que embalam
criada a redoma encubro os dedos
em seu colo
e com os olhos guardamos
o alicerce da casa
ninguém ameaça -- andamos reclusas
ela me despe da blusa
e dos males do mundo
um dia
acabou a música.
gritei aos céus
e atiraram pedras frias.
criavam lacunas
que eu expulsava
como se expulsa um cisco.
as pedras
sulcaram no rosto
uma colmeia.
romperam as veias.
e a música.
nada no céu.
e no meu corpo.
a surdez das pedras.
aqueles que me ultrapassam são outros
e eu sou sua outra
o rosto rouco da espera
aqui!, mas o ônibus ri
passa reto e sem ninguém
(todo ônibus tem o desejo
secreto de levar ninguém)
sisudas rodas no asfalto
seu único calor é o atrito
braço adiante – estou aquém
de sua ânsia de rodar
meu grito não alcança ser grito
sou roda de pedra
e com trava
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