As palavras não
avançaram aos ouvidos de forma encadeada. Não há tradução de cada pedaço da
frase, mas o conjunto se sobressai. Não é preciso mais que dois segundos para
dizê-lo. Sendo só três palavras – e palavras curtas, monossílabas e dissílabas
– poderiam ter sido esquecidas por uma interferência no telefonema ou abafadas
por uma tosse. Mas, da garganta de onde saíram, conseguiram ultrapassar os quilômetros
de distância e vibrar no rosto daquela que tossiu e respondeu eu também. Muitos
sermões de horas já foram esquecidos completamente, é possível ler um livro
inteiro e depois não se lembrar de nenhum pedaço, mas três palavras às vezes
duram anos. É sempre possível voltar a elas algum dia por vontade ou descuido
ou masoquismo. Ela volta às vezes. Ela se pergunta se existiram de fato.
Aquela foi a única vez
– mas foi o aval para que ela dissesse mais vezes eu também, mais vezes não
muitas. Ele nunca mais disse. Ele nunca disse pessoalmente. Mas ela acreditava
no olho – ele tinha esse olho irônico, áspero que ela tanto gostava
principalmente por senti-lo tão pouco áspero quando havia esse estado de
mornidão entre alguns beijos. Era como os pregos reunidos a formar uma cadeira
onde se sentasse, o ronronar de um tigre que não se quisesse domar. Ele olhava
com aquele olho quente e ela sabia que, mesmo que ele não mais dissesse, estava
ali. Não reparou desde quando sabia disso, embora fosse muito antes da ligação.
Ela sabia, simplesmente. E por mais que a voz dele não expressasse nenhuma
doçura, pelo corpo ela sabia, pelo olho. E a confirmação não acrescentou mais
certeza, mas deu-lhe a possibilidade de responder que sim, ela também. Deu a
possibilidade de dizer mais vezes sem sentir perder sua dignidade, sem se
atirar sozinha. Mesmo que ele não repetisse, ele havia dado o primeiro tiro.
Ela tinha certeza em
tudo dele. Sabia que era brutalmente honesto, beirando a insensibilidade. Sabia
que era complexo e em verdade incompreensível. Se se permitiu criar certezas a
respeito dele foi por hábito, erro de cálculo ou amor. Quando ele terminou, ela
não pôde ver o olho. Era por mensagens – sucintas, controladas. Não sabia se o
áspero estaria condensado em algo quente, se ainda seria possível sentar nos
pregos – imaginava os olhos de gelo, quase malignos. Ela perdeu algumas
certezas, admitiu as quedas e teve ódio. Abandonou o jogo por minutos, esqueceu
a regra dos tiros e cobrou-lhe o amor. Ele pediu calma. Disse que nunca houve amor.
Um gosto, quem sabe. Ela cobrou o esquecimento, engoliu qualquer soberba,
mencionou o telefone e as palavras que houveram dentro dele meses passados. Ele
nem lembrava, disse, ele nem amava, disse. Ele estava fora dela. Era hora de
encerrarem-se certezas e frases longas ou curtas.
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