quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Casas de madeira, a cidade, e o que manda o sangue

O cenário do filme é tão simples que deslumbra. Há uma casa de madeira em meio ao mato, sozinha e escondida. Na platéia, ele suspira os sonhos que guarda. Sussurra para ela tu já morou numa casa de madeira? É quente no verão e fria no inverno. Ela sorri. O cenário é bonito mesmo, viver assim seria bonito, estar com ele. Mas o sangue que desliza no corpo, o sangue não mente dentro dela. Tudo ansia por cidade e movimento. Precisa estar onde está para que o sangue continue a seguir seu rumo. Mas se quer movimento, o que o corpo quer ali, prendendo as mãos em mãos do outro? Se quer prender-se, por que o sangue clama e clama por fluir? O corpo às vezes deseja tudo misturado. O sabor das contradições lhe é mais gostoso.
Ela tem medo. Parece estar de volta nas estradas por onde escapou. O filme é esteticamente bonito, mas às vezes ela se pega sem ouvir as falas, perdendo pedaços do enredo, no pensamento outros filmes. Estar ali é contraprodutivo, mas ela nunca foi uma pessoa prática. Abraça mais o corpo dele, que queima de um desejo e uma saudade. Quentura. Ele é tudo que ela sente de mais estranho, ele era tudo que dava e não dava certo. Ela não entende porque tudo se inquieta e o filme se impacienta, e só o que o corpo deseja é um passo e outro do corpo do outro. O movimento gostoso do corpo do outro. Um beijo mataria mil sedes que tivesse, ao mesmo tempo em que criasse mil sedes mais, a serem mortas na própria saliva. Ela tem medo, veste mais dúvidas. O que a boca anseia não é o que ela sabe e entende. Ela sabe o que o sangue já sabe: não está ali o que busca. Mas no modo como as coxas se apertam, no modo como palpita, ela esquece por um tempo do que havia de buscar.

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